fevereiro 09, 2007

11 - (IVG) Ler a pergunta.



Finalmente, e agora sim, ler a pergunta:

Concorda com a despenalização de interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas 10 primeiras semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?

Desfiando:

Despenalização” – Existe desde logo uma certa confusão de termos. É que uma “despenalização”, de acordo com uma correcta aplicação dos termos jurídicos, pressupõe uma causa e um fim específicos, ou seja, a despenalização do aborto até às 10 semanas, sê-lo-ia no caso dessa despenalização ser restringida a um determinado número de ocorrências e situações devidamente explicitadas a incluir. Como acontece na actual lei. Mas não é o caso. Trata-se aqui de uma abertura total e sem um alargamento concreto de limites. Por isso, “liberalização” seria o termo correcto.

Interrupção” – Eis a mais evidente ilusão eufemista das palavras. Não está aqui em causa uma qualquer “interrupção”, na medida em que tal pressupõe a possibilidade de retoma, o que não é o caso, o aborto é irreversível. Trata-se de uma questão de escolha de palavras menos propícias à rejeição, ainda que falseadas.

Interrupção voluntária da gravidez” – Ora, tendo em conta o óbvio interesse de estreitar e simplificar, tanto quanto possível, uma pergunta que já de si é complexa, dividir por 3 palavras aquilo que toda a gente conhece simplesmente como “aborto” (e que também assim aparece na actual lei), vai tão só ao encontro desta busca pelo encapotar de realidades, procurando dar-lhes um tom coloquial que, na verdade não têm.

Por opção da mulher” – Quando se incluiu já, mais atrás, a expressão (de valor jurídico) “interrupção voluntária da gravidez”, explicitou-se claramente a ideia agora repetida. Se há uma gestação “voluntariamente interrompida”, tal só poderá obviamente dar-se “por opção da mulher”. Logo, aqui se encontra mais uma forma de puxar por um sentimento de benefício e valorização da mulher, que, dada a natureza do aborto, é falso.

Nas 10 primeiras semanas” – Porquê 10 semanas?!? Eis uma solução totalmente arbitrária, na medida em que, no processo de gestação, nada ocorre por esta altura que permita uma diferenciação de etapas. Portanto, uma definição sem fundamento, logo, a-jurídica. Mas o mais absurdo é que a tese dos abortistas leva a considerar a mulher como criminosa a partir das 10 semanas de gravidez…! É aceitável que se mate até às 10 semanas, a partir daí, é crime com direito a prisão!

Legalmente autorizado” - Não se diz “legalmente autorizado” (cá está, uma forma de moldar as consciências apelando a um sentimento de legalidade/legitimidade em tudo isto) mas sim “oficiais” ou “oficialmente reconhecidos” (segundo o art.142º, nº1 do CP).


Posto isto, eis a pergunta honesta:

Concorda com a liberalização do aborto até às 10 semanas em estabelecimento de saúde oficialmente reconhecido?

Veja-se como é concisa e clara! E não falta lá nada do que vai a referendo!


A pergunta que vai a referendo, está perfeitamente construída para provocar a dispersão na sua leitura, ao mesmo tempo que visa projectar uma série de ideias sucintas, que concorram para a sua aparente lógica e pertinência:

Termos como “despenalizar”, “saúde”, “legal” ou “autorizado”, concorrem para uma imediata concordância à primeira análise feita. E não estão lá colocados por acaso. Por outro lado, a ideia de ser “por vontade da mulher”, confere uma certa benevolência a algo que é óbvio e inevitável. Por fim, a abolição da palavra “aborto”, sendo trocada por 3 outras palavras, é sintomática de um incómodo que se quer evitar na pergunta.


A Lei actual trata de um enquadramento que prevê a licitude do aborto para determinados casos, logo, é simples de compreender que trata de regulamentar excepções, devidamente explicitadas e limitadas.

Ora, a despenalização até às 10 semanas agora proposta, não pretende incluir qualquer regime de excepção, não pretende regular novos casos ou razões passíveis de despenalização, mas simplesmente de colocar aquilo que é actualmente um bem jurídico (a vida intra-uterina) à completa mercê do livre critério da mulher. Ou seja, esse bem jurídico fica "interrompido" até às 10 semanas de gestação, surgindo com toda a pujança apenas 1 dia depois, na plenitude dos seus direitos e garantias. Esta sim é a questão.

É que, caso se pretendesse apenas incluir uma nova excepção, como defendem os do “SIM”, a pergunta do referendo era outra:

Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, caso se mostre indicada para evitar perigo de morte ou grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher, designadamente por razões de natureza económica ou social, e, realizada nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?”

É uma pergunta longa e complicada não é? Mas era bem mais honesta.

Para finalizar, lembremos que este referendo apenas acontecerá “porque o resultado não agradou aos políticos, que ousam estabelecer uma rota de “evolução” correcta para o país, à revelia da própria população, algo semelhante à reacção dos federalistas europeus face à recusa do Tratado Constitucional para a UE em França e Holanda, avaliando os resultados como derivados de uma espécie de engano popular qual atestado de incapacidade de autodeterminação desses povos.
Em 98 venceu o NÃO, que para eles não valeu, porque não foi vinculativo (não votou 50% da população). Agora, tudo aponta para uma abstensão semelhante. Se tivesse ganho o SIM, ainda que fosse de forma não vinculativa, alguém quereria repetir o referendo agora? E se o SIM ganhar sem 50% de eleitores, repete-se daqui a 8 anos o referendo?”

Os abortistas têm é de começar por ser honestos com o eleitorado. Não se trata apenas de tirar as mulheres do banco dos réus (o que não acontecerá), que é a sua principal bandeira, trata-se sim de considerar que até determinado momento, o livre interesse da mulher, independentemente de tudo o resto, se deve sobrepor à vida do feto, é essa a sua real pretensão. Partindo do princípio que o feto não é humano, pretende-se dispor livremente desse corpo, como se de um apêndice da mulher se tratasse, talvez por problemas financeiros desta, outras vezes por não ter condições psicológicas para continuar a gravidez, mas, em último caso, porque simplesmente entende não ser a altura ideal segundo a sua lista de prioridades.

É esta a verdadeira perversidade da Lei, a sujeição da Vida ao livre arbítrio de alguém que, não só teve direito a nascer, como assumiu uma postura propícia a esse estado natural.

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Mais uma exégese arquitectada "às 5 da manhã"...

Esta também merecia pancada por parte do Gato Fedorento!...

sexta-feira, 09 fevereiro, 2007  
Blogger A minha verdade said...

Acha mesmo que sim...?! Vá lá, dê o seu melhor... Mas informe-se bem. Olhe que aqui não há a esperteza saloia de se mandar umas postas de pescada sabendo não haver resposta pelos mesmos meios, como no "Gato"!

sábado, 10 fevereiro, 2007  

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